A defesa de Bolsonaro confirmou que o ex-presidente ficou dois dias hospedado na embaixada, “a convite” (leia mais abaixo).
Segundo os advogados, Bolsonaro esteve no local para “manter contato com autoridades do país amigo”. A defesa também afirma que, no período, o ex-presidente conversou com diversas autoridades húngaras “atualizando os cenários políticos das duas nações” (leia aqui a íntegra da nota da defesa de Bolsonaro).
Bolsonaro tem uma relação de proximidade com Viktor Orbán, o primeiro-ministro da Hungria, há anos, a começar pelo espectro político: ambos são de extrema-direita. Orbán veio à posse de Bolsonaro em janeiro 2019 e, em abril daquele ano, recebeu Eduardo Bolsonaro em Budapeste.
New York Times: Bolsonaro se escondeu em embaixada da Hungria
O plano de Bolsonaro era viajar a Budapeste em 2020, mas houve a pandemia de Covid-19, e ele só fez a viagem dois anos depois, em 2022. Nessa visita, Bolsonaro chamou Orbán de “irmão”.
Os dois estiveram juntos mais recentemente na Argentina, em dezembro de 2023, durante a posse do presidente Javier Milei.
No dia 8 de fevereiro deste ano, horas após a operação da PF contra Bolsonaro —e dias antes de o ex-presidente passar as duas noites na embaixada da Hungria—, Orbán utilizou uma rede social para declarar apoio ao amigo. Orbán postou uma foto com Bolsonaro com a seguinte legenda: “Um patriota honesto. Continue lutando, senhor presidente Jair Bolsonaro”.
Postagem de Viktor Orbán no dia em Bolsonaro foi alvo de uma operação da Polícia Federal — Foto: Reprodução/X
Quem é Viktor Orbán
Orbán é um advogado que se elegeu parlamentar pela primeira vez nos anos 1990, pouco após o fim do regime comunista na Hungria. Ele foi eleito primeiro-ministro em 1998 e ficou no cargo até 2002, quando perdeu a reeleição. O partido dele, então, começou a adotar um discurso mais nacionalista e religioso.
Em 2010, Orbán voltou ao poder e está no cargo desde então. O político foi reeleito em 2014, 2018 e 2022 —trata-se do líder mais longevo dos países da União Europeia.
O governo do primeiro-ministro foi marcado por redesenho dos mapas dos distritos eleitorais que, na prática, beneficiou a eleição de parlamentares do partido de Orbán, o Fidesz.
O Parlamento aprovou uma nova Constituição e também medidas para controlar o Judiciário. Por exemplo: o número de juízes da corte máxima do país cresceu de 11 para 15, e o próprio Orbán indicou os quatro novos membros.
Outra medida: para conseguir nomear mais pessoas para cargos no Judiciário, ele também diminuiu a idade de aposentadoria compulsória –dessa forma, abriram-se vários postos que precisavam de indicações.
Orbán criou ainda um órgão que passou a indicar novos juízes e a distribuir processos entre os diferentes tribunais.
A Constituição húngara dá ao Executivo a prerrogativa de tomar decisões sobre como devem funcionar setores da iniciativa privada, como a cultura e o esporte.
Alinhado à extrema-direita, o governo de Orbán tem um discurso contrário aos imigrantes e implementou medidas contra eles: em 2015, o país construiu barreiras para evitar que refugiados chegassem ao território húngaro.
Houve também mudanças em livros didáticos para incluir nos textos escolares trechos que falam que há perigos na imigração e defendem a ideia de um país “homogêneo”.
Operação da Polícia Federal
Quatro dias após a operação da Polícia Federal, câmeras de segurança da embaixada da Hungria registraram a entrada do ex-presidente no local, que fica na parte Sul de Brasília. As imagens foram obtidas pelo jornal norte-americano.
De acordo com o periódico, Bolsonaro ficou na embaixada húngara por dois dias a partir do dia 12 de fevereiro. Ele estava acompanhado de dois seguranças, do embaixador da Hungria no Brasil e de outros membros da equipe diplomática.
O “NYT” afirma que o ex-presidente não poderia ser preso em uma embaixada estrangeira que o recepcionasse, uma vez que esses endereços estão legalmente fora da área de atuação das autoridades locais.
O jornal norte-americano diz ainda que a estadia de Bolsonaro na embaixada da Hungria sugere que o ex-presidente estaria tentando se esquivar da justiça brasileira e de desdobramentos das investigações contra ele, valendo-se da amizade que tem com o primeiro-ministro húngaro, o ultradireitista Viktor Orbán.
Duas noites no local
Segundo o “The New York Times”, Bolsonaro chegou à embaixada da Hungria na noite de segunda-feira, 12 de fevereiro, e deixou o local na tarde da quarta-feira, 14 de fevereiro. O jornal analisou três dias de gravações das câmeras de segurança da embaixada.
O “NYT” utilizou confrontou as imagens do circuito interno com imagens de satélite que mostram que o carro em que Bolsonaro chegou ao local estava estacionado no endereço no dia 13 de fevereiro.
As câmeras de segurança registraram Bolsonaro circulando pelo local no período.
Ao jornal, um funcionário da embaixada da Hungria teria confirmado, sob a condição de anonimato, o plano para receber o ex-presidente no local.
O que diz a defesa de Bolsonaro
Leia a seguir a íntegra da nota divulgada pelos advogados de Jair Bolsonaro:
COMUNICADO AOS VEÍCULOS DE IMPRENSA
O ex-Presidente da República, Jair Bolsonaro, passou dois dias hospedado na embaixada da Hungria em Brasília para manter contatos com autoridades do país amigo.
Como é do conhecimento público, o ex-mandatário do país mantém um bom relacionamento com o premier húngaro, com quem se encontrou recentemente na posse do presidente Javier Milei, em Buenos Aires.
Nos dias em que esteve hospedado na embaixada magiar, a convite, o ex-presidente brasileiro conversou com inúmeras autoridades do país amigo atualizando os cenários políticos das duas nações.
Quaisquer outras interpretações que extrapolem as informações aqui repassadas se constituem em evidente obra ficcional, sem relação com a realidade dos fatos e são, na prática, mais um rol de fake news.
São Paulo, 25 de março de 2024.