Esses mesmos especialistas avaliam o posicionamento de Lula como “positivo”, mas ponderam que o atual presidente da Venezuela tem emitido “sinais ruins”.
Lula e Maduro têm uma reunião marcada para esta sexta-feira (1º) em São Vicente e Granadinas, onde participam da Cúpula da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac).
Lula tem reunião com presidente da Guiana sobre disputas com Venezuela
A expectativa é que entre os temas abordados pelos dois políticos estejam as eleições venezuelanas — marcadas para o segundo semestre deste ano.
Desde que tomou posse, no ano passado, o presidente brasileiro tem tentado se aproximar de Maduro.
No ano passado, por exemplo, Lula recebeu o venezuelano no Palácio do Planalto. Na ocasião, Lula chegou a ser criticado porque, ao se dirigir a Maduro, disse que o presidente do país vizinho era alvo de “narrativas” sobre a democracia local e que, diante disso, precisava criar sua própria narrativa.
“Maduro não tem nenhum compromisso com a democracia. Zero compromisso. E não acredito que o presidente Lula tenha capacidade de influenciá-lo”, afirmou o professor Pio Penna Filho, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB).
“É uma coisa positiva [a discussão proposta por Lula] pelo fato de estar colocando o tema para discussão, colocando o tema na agenda. Agora, isso vai sair da retórica? Eu não acredito. Vai ficar no plano do discurso político. Já é algo positivo, mas, medidas concretas, não acredito”, completou.
Na condição de anonimato, um ex-chanceler brasileiro afirmou que o presidente Lula age “corretamente” ao defender as eleições no país, mas que não é possível prever qual será o comportamento de Maduro.
“O presidente Lula sempre teve essa postura a favor da democracia. Ele age corretamente. Mas é difícil entender o que pensa o Maduro”, declarou.
‘Sinais ruins’
Em uma rede social, Nicolás Maduro anunciou nesta quarta-feira (28) ter chegado a um acordo para que ocorra eleições neste ano na Venezuela.
“Neste 2024, na Venezuela, haverá eleições presidenciais. Depois de quase um mês, a Assembleia Nacional realizou um trabalho árduo e exemplar, emoldurado pelo diálogo e pelo entendimento. Hoje temos um acordo amplo e inclusivo, que incorporou todos os setores e nos garantirá que na Venezuela haja eleições livres, democráticas e inclusivas”, escreveu.
Para um integrante da diplomacia brasileira, porém, apesar do anúncio, os sinais dados por Maduro ao longo dos últimos meses foram “ruins”, demonstrando que são “pequenas” as chances de o presidente venezuelano seguir os conselhos de Lula.
“São pequenas [as chances de Lula influenciar Maduro]. Os sinais são muito ruins. Bloquearam a candidatura de oponentes, sinais de que [a votação] não será normal. […] Vamos entender ainda o que é este último movimento, mas, como disse, os sinais são ruins”, afirmou esse diplomata.
Para integrantes do Itamaraty, Maduro vem “esticando a corda” e agindo na “contramão” do Acordo de Barbados, que, entre outros pontos, prevê eleições no país neste ano e libertação de opositores presos.
Defesa dos valores democráticos
Para o conselheiro emérito do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), Marcos Azambuja, o Brasil não deve elogiar ou criticar candidatos, mas, sim, reforçar a defesa dos valores democráticos, citando eleições livres e fiscalizadas por organismos internacionais e pela imprensa, por exemplo.
Ex-embaixador do Brasil em países como França e Argentina, Azambuja avalia que o governo Lula deve respeitar a soberania interna, se colocando como mediador, não como protagonista.
“Você não pode se deixar seduzir pela iniciativa, buscando visibilidade maior que a necessária. O mediador que se manifesta sobre questão de outro país deve ter cuidado extremo para não parecer interventor. Portanto, sobriedade, modéstia e quase que invisibilidade. Tem que ter cuidado para não aparecer como protagonista, apenas estar à disposição dos que estão jogando o jogo”, avaliou.
Azambuja acrescenta que, nos encontros com Maduro, Lula precisa ter “disciplina na palavra” e “cuidado com adjetivos”
“[No passado] o Brasil se envolveu demais com a política interna venezuelana contra o Maduro, o que foi um erro. Não temos que nos envolver demais agora a favor do Maduro. O que temos de fazer é jogar o jogo, defendendo regras claras”, prosseguiu.
Para Azambuja, qualquer iniciativa a favor da democracia é positiva, porém, Lula precisa demonstrar “sobriedade” ao longo dos próximos meses e ficar “alheio” ao que chamou de “jogo político interno”, isto é, sem se posicionar a favor de determinado candidato.