Na última semana, em discurso no Fórum Econômico Internacional das Américas, o presidente disse que quer integrar o formato dos bancos ao mercado de capitais, para que a Argentina possa migrar para um “sistema bancário livre”.
“E, neste contexto, também mandatar a lei de não emissão monetária, onde consideramos que a senhoriagem é crime, é roubo, é falsificação, é fraude. Emitir dinheiro é uma farsa”, disse o presidente.
Em entrevista à “CNN en Español”, que foi ao ar neste domingo (31), Milei explicou que o objetivo por trás de reformar o sistema financeiro é, justamente, fechar o Banco Central do país — reafirmando uma de suas principais promessas de campanha.
O presidente considera que o BC é “um dos principais mecanismos pelos quais os políticos roubam os cidadãos, da forma mais grosseira e violenta” e destaca que “não adianta fazer várias reformas se o BC não for fechado”.
Assim, a substituição da moeda oficial da Argentina, o peso, por uma moeda internacional, como o dólar, só seria possível após o ajuste dessas questões, segundo Milei.
Ele também comentou que não necessariamente o país será dolarizado neste processo, mas que é a própria população quem vai escolher qual moeda melhor atende as necessidades comerciais e sociais do país.
“A realidade é que não falamos estritamente sobre a dolarização. Sempre falamos sobre competição cambial. E, nesta competição cambial, se for imposta uma moeda, a moeda que vai ser imposta, devido às preferências dos argentinos, é muito provável que seja o dólar”, disse.
Neste contexto, Milei afirmou não acreditar que a dolarização aconteça antes das eleições legislativas do meio de 2025.
Senado da Argentina rejeita pacote de medidas de Milei
Primeiros meses de governo e parcerias comerciais
Quando perguntado sobre qual a maior conquista do seu governo nos 100 primeiros dias de gestão, Milei destacou ter “evitado a hiperinflação” da Argentina.
O Banco Central da Argentina, um dia antes da divulgação da inflação do país, optou por reduzir a taxa básica de juros de 100% para 80% ao ano, citando que “desde 10 de dezembro de 2023, a situação econômica apresenta sinais visíveis de redução da incerteza macroeconômica”, além de registrar uma “trajetória de queda da inflação no varejo”.
Sobre o futuro, além dos planos com a reforma do sistema financeiro, fechamento do banco central e uma eventual dolarização, Milei também ressaltou o objetivo de manter alinhamento comercial com os Estados Unidos.
O presidente já declarou publicamente inúmeras vezes seu apoio e apreço pessoal ao ex-presidente americano Donald Trump, que é candidato à reeleição no país em 2024. No entanto, mesmo que o atual presidente Joe Biden ganhe a disputa pela Casa Branca, Milei disse que isso não será um problema e que manterá uma boa relação com o país.
“Independentemente de quem esteja no comando, e além das minhas preferências, que são públicas, minha prioridade é ser aliado dos Estados Unidos”, comentou.
Perspectivas para a dolarização da Argentina
Em entrevista recente ao g1, o professor Paulo Feldmann, da FIA Business School, explica que a Argentina não tem recurso suficiente para conseguir promover a dolarização da economia — uma vez que é necessário substituir todo o dinheiro nacional em circulação pela moeda americana.
Então, como só os Estados Unidos podem emitir dólar, a Argentina depende que o Tesouro americano coloque mais moeda para circular. As reservas internacionais do país estão vazias e o próprio Milei disse, em seu discurso de posse, que não há dinheiro.
Assim, o primeiro desafio para a dolarização argentina hoje é, justamente, conseguir a quantidade de dólares suficiente para dar conta de toda a dinâmica econômica, além da necessidade que o presidente tem de provar que o país pode ser estável e confiável para atrair investimentos.
São tarefas difíceis, pensando que tornar um país realmente mais atrativo para receber investimentos é um trabalho de longo prazo, enquanto um mandado presidencial dura apenas quatro anos — e Milei já está na metade do primeiro ano.
Essa não seria a primeira vez, porém, que o país passaria por uma tentativa de dolarização. Na década de 1990, durante o governo de Carlos Menem, o então ministro da economia, Domingo Cavallo, desenhou um pacote de medidas para equilibrar a difícil situação da economia, e que determinou a paridade entre a moeda argentina e o dólar.
O Plano Cavallo, como ficou conhecido, visava a estabilização da economia, mas acabou em uma crise ainda maior do que o país já se encontrava, com uma taxa de desemprego de 18,3% e o indicador de pobreza em 34,32% no começo dos anos 200.
O principal problema, segundo Feldmann, é que, na época, ao mesmo tempo em que a Argentina aumentava sua dependência por dólar, o governo promoveu uma série de privatizações e a abertura econômica, o que tirou dinheiro do país e acabou com a paridade entre os preços do dólar e da moeda do país.
A tarefa de Milei, agora, é provar suas medidas econômicas a tempo, enquanto a Argentina continua passando por um período desafiador.