O argumento foi defendido ao longo do julgamento pela advogada de defesa, pela esposa de Alves, Joana Sanz, por amigos, pelo psicólogo que o acompanhou ao longo do ano passado e pelo próprio Daniel Alves em seu depoimento nesta quarta-feira (7).
A insistência na versão é uma tática na tentativa de conseguir uma redução de pena caso Daniel Alves seja condenado, segundo disseram especialistas em direito penal à imprensa espanhola.
O Código Penal espanhol tem dois artigos que estabelecem que o consumo de álcool pode ser um atenuante em casos de agressão sexual – a Espanha não tem tipificado em seu código o crime de estupro, e, por isso, acusações com a feita a Daniel Alves são julgadas sob o guarda-chuva do crime de agressão sexual.
Os artigos determinam que casos em que o autor do crime, “no momento de cometer a infração penal, esteja em estado de intoxicação plena pelo consumo de bebidas alcóolicas, (…) o transtorno mental transitório pode ser um atenuante”.
No entanto, o código também determina que o atenuante só poderá ser considerado em casos de “grave adição” de substâncias como o álcool.
Em seu depoimento nesta quarta, Alves declarou que tomou “umas garrafas de vinho e várias doses de uísque” durante um jantar com amigos antes de que o grupo fosse à boate. Depois, em um bar, afirmou, tomou gim tônicas e chegou à boate Sutton, onde a acusada diz ter sido estuprada pelo brasileiro, já muito embriagado.
Mais cedo, o psicólogo que o acompanhou ao longo do ano passado na prisão – Alves está preso preventivamente desde 20 de janeiro de 2023 – também afirmou que seu paciente não costuma beber e, por isso, ficou muito afetado pelo consumo de álcool na noite do suposto crime.
A versão do excesso de bebida foi defendida ainda pela esposa de Alves, a modelo espanhola Joana Sanz. Ela foi uma das 28 testemunhas convocadas a depor nos três dias de julgamento e, em sua fala, disse que, na data, seu marido chegou em casa muito embriagado e até “se chocou contra um armário e caiu na cama”.
Recurso habitual
O argumento de que a bebida afetou as faculdades normais do acusado é um recurso habitual em casos do tipo, segundo disse à TVE o professor de direito penal e criminologia da Universidade Nacional de Educação à Distância (Uned), Sergio Arroyo.
“Mas esse estado tem de ser demonstrado e comprovado, o que pode ser feito através de gravações que mostrem os movimentos do acusado, relatos e até um registro de sua consumação”, afirmou Arroyo à TVE.
Para isso, dois investigadores do caso disseram, também em depoimentos prestados no julgamento desta semana, que analisaram a cartela de consumação de Daniel Alves na boate Sutton e também a nota fiscal do bar e do restaurante nos quais Alves e seus amigos estiveram antes.
No entanto, os investigadores afirmaram que, na noite do ocorrido, Daniel Alves “não estava totalmente embriagado” e tinha “suas capacidades cognitivas ligeiramente afetas, mas sabia o que estava acontecendo”.
Daniel Alves participa de terceiro dia de julgamento
Médicos que prestaram depoimento no julgamento do ex-jogador brasileiro Daniel Alves nesta quarta-feira (7), na Espanha, confirmaram ter encontrado DNA de Alves em material coletado dentro do corpo da espanhola que diz ter sido estuprada por ele.
Os médicos confirmaram a versão da imprensa no depoimento desta quarta. Eles falaram durante o último dia do julgamento, quando também está previsto o esperado depoimento de Daniel Alves.
Mas a Justiça de Barcelona, onde ocorrem as sessões, estuda prolongar o julgamento até quinta-feira (8), caso a fala de Alves se estenda mais que o esperado.
O brasileiro chegou algemado e escoltado por cinco policiais à sessão desta quarta, iniciada por volta das 15h15 no horário local (11h15 no horário de Brasília).
Pela programação divulgada pelo Tribunal de Justiça da Catalunha, ele falará ao final da sessão, após o depoimento dos médicos.
Um psicólogo que fez o acompanhamento da mulher nos meses que se seguiram à denúncia disse que ela desenvolveu um sintoma pós-traumático ao ouvir pessoas falando em português, o idioma que Alves e seus amigos falavam na boate onde, segundo ela, houve o estupro.
Depoimento do ex-atleta
Julgamento de Daniel Alves — Foto: Jordi BORRAS / POOL / AFP
Esta será a primeira vez que Alves falará publicamente sobre o caso desde que foi preso, em 20 de janeiro de 2023, enquanto prestava depoimento em uma delegacia de Barcelona. Na ocasião, a polícia viu contradição na versão dada pelo brasileiro.
A expectativa para esta quarta é que o ex-atleta, que há mais de 380 dias em prisão preventiva, apresente no tribunal uma nova versão sobre o episódio. Ele deve insistir na versão que sua defesa deu esta semana, de que estava embriagado e, por isso, teve suas “faculdades alteradas”.
Isso pode garantir a Alves uma redução de pena – caso haja embriaguez provada, a Justiça pode reduzir a pena em cerca de três anos, neste caso.
Durante a sessão desta quarta, um médico que acompanhou o estado psicológico de Alves disse que ele não estava acostumado a beber e, consequentemente, suas capacidades cognitivas e motoras foram afetadas no dia.
- No início de janeiro de 2023, em um vídeo enviado ao canal espanhol Antena 3 depois que o caso veio a público, o jogador negou ter ocorrido relação sexual e disse que sequer conhecia a denunciante. “Nunca vi essa senhora na vida”, afirmou.
- Dias depois, em um primeiro depoimento à polícia, Daniel Alves declarou ter entrado no banheiro junto com a espanhola, mas negou ter havido qualquer relação entre os dois.
- Em 20 de janeiro, convocado a um segundo depoimento em uma delegacia de Barcelona, quando foi preso em flagrante, o jogador Alves alegou que a jovem praticou sexo oral nele, porém de forma consensual. O atleta mudou a versão ao ser confrontado pela polícia com imagens da boate.
- Em 17 de abril de 2023, já preso, Daniel Alves declarou à juíza responsável pelo caso que manteve relações sexuais consensuais com penetração (àquela altura, exames periciais haviam encontrado sêmen do jogador na espanhola). O brasileiro, que era casado com modelo espanhola Joanna Sanz quando ocorreu o episódio na boate, argumentou ter mentido, em um primeiro momento, para ocultar uma relação extraconjugal.
Conheça todas as versões dadas por Daniel Alves para a acusação de estupro
No início da sessão no primeiro dia de julgamento, na segunda-feira (5), a advogada do ex-atleta, Inés Guardiola, afirmou que o jogador se diz vítima de um “tribunal paralelo”, feito, segundo ele, pela opinião pública. A defesa pediu a anulação do julgamento, alegando que a juíza responsável pelo caso não aceitou que um segundo perito examinasse a vítima.
Guardiola solicitou também que novos testes fossem realizados e, só depois disso, que o julgamento fosse retomado. A juíza não acatou o pedido, e a Promotoria contestou na sessão que todos os direitos do acusado foram preservados.
Julgamento
As 28 testemunhas convocadas a depor foram indicadas para participar do julgamento tanto pela defesa quanto pela acusação.
- Seis testemunhas prestaram depoimento na primeira sessão, entre elas, a mãe de Daniel Alves.
- As outras 22 testemunhas falaram na terça.
- Nesta última sessão, peritos que entregarão um relatório e conclusões, e a juíza responsável pelo caso ouvirá Daniel Alves.
A juíza Isabel Delgado Pérez, que julga o caso, ficará responsável por elaborar a sentença. Ao g1, o tribunal disse que ainda não há prazo para que saia a sentença final ao jogador, mas especialistas em direito penal disseram à imprensa espanhola que a decisão não deve demorar, já que a Justiça fez uma investigação prévia ao longo do ano passado.
Enquanto a sentença não sai, Daniel Alves permanecerá em prisão preventiva, em um presídio nos arredores de Barcelona, segundo a decisão atual da Justiça.
O Ministério Público espanhol pede nove anos de prisão ao jogador. A defesa da mulher que denunciou o estupro queria uma sentença maior, de 12 anos de prisão.
O que diz a acusadora
A mulher que acusa Daniel Alves de estupro afirma que, na noite em que, segundo ela, o estupro ocorreu, estava com uma amiga e uma prima na área VIP da boate Sutton e que já tinha dançado com o jogador e amigos dele. Depois disso, diz ela, o atleta insistiu para que a jovem o acompanhasse até um outro recinto.
A jovem alega que achava que, nesse segundo espaço, havia uma nova área VIP. Ao entrar, no entanto, notou que estava num banheiro pequeno, que só tinha um vaso e uma pia. Lá, segundo a acusadora, aconteceu o estupro.