O duro retrato da conduta e da acuidade mental de Biden fornecido pelo procurador foi um presente para o adversário Donald Trump — apenas quatro anos mais novo e ele, sim, réu num processo por reter lotes de material secreto do governo americano em sua residência na Flórida.
Favorito a obter a indicação republicana para disputar, em novembro, a Presidência dos EUA, o ex-presidente recebeu de bandeja munição gratuita para torpedear Biden. Sua campanha deflagrou imediatamente os habituais ataques ao presidente, embalados no etarismo.
Ninguém lembrará do relatório de Hur por ter poupado Biden de acusações criminais, mas pela descrição detalhada de seu declínio cognitivo, como se fosse um geriatra referindo-se a um paciente: “É homem idoso simpático, bem-intencionado e com uma memória ruim”, relatou o procurador, nomeado em 2017 por Trump para o cargo. Em outras palavras, segundo ele, Biden estava velho demais para se dar conta de que compartilhou documentos confidenciais.
“Sou bem-intencionado e sou um homem idoso e, que diabos, sei o que estou fazendo. Sou presidente e coloquei este país de pé!”, respondeu o presidente, ao mesmo tempo furioso e emocionado, numa entrevista horas depois da divulgação do relatório do procurador especial.
A esta altura, não havia como conter os danos. Ao respsponder a uma pergunta sobre a guerra em Gaza, o presidente ainda confundiu o presidente do Egito, general Abdel al-Sisi, com o do México. Em uma semana, Biden cometeu outras gafes: relatou episódios vividos com Angela Merkel e Emmanuel Macron como se tivessem ocorrido com Helmut Kohl e François Mitterrand, que já morreram.
Neste capítulo, Trump, que retrata Biden como mentalmente incapaz para o cargo, também tem sido traído pela memória. Chamou Nikki Haley, sua adversária na corrida republicana, de Nancy Pelosi, a ex-presidente democrata da Câmara de Representantes. O republicano já confundiu Biden com Obama e disse que, com o presidente no poder, os EUA chegariam rapidamente à “Segunda Guerra Mundial”.
Uma pesquisa da CNN publicada em novembro indicou que apenas 25% dos americanos acreditam que Biden tenha resistência para servir novamente como presidente. Quando se trata de Trump, o índice aumenta para 53%. Seja um ou outro, o fato é que ao fim dos próximos quatro anos, a Casa Branca será comandada por um octogenário e não há como mudar essa realidade.